Audiência pública debate caminhos para conter violência nas escolas
Uma audiência pública realizada na noite desta terça-feira (18.abr), no plenário Teotônio Vilela, proposta pelo vereador Professor Marcos Carvalho (PT), ouviu diferentes profissionais do sistema educacional com o objetivo de propor caminhos para proteger crianças e jovens da violência nas escolas.
O debate foi sugerido pelo vereador a partir do recrudescimento dos casos em unidades de ensino de todo o país, com a morte de uma professora em São Paulo e de quatro crianças em Santa Catarina, além de ameaças que aconteceram, inclusive, em Goiás.
“O que queremos aqui é uma ação propositiva, com o objetivo de amenizar os danos já causados e propor caminhos daqui para frente”, explicou Professor Marcos ao abrir a audiência pública.
Ao final, após mais de duas horas de relatos e posicionamentos, o vereador propôs a realização de um fórum popular de educação, em que universidades, entidades e poder público sejam parceiros, para aprofundar todos os caminhos levantados durante a audiência.
“Que a gente avance no debate sem parecer que tem uma receita de bolo. Precisamos construir políticas públicas e isso leva tempo e exige mais tempo”, disse Professor Marcos, que também apontou algumas questões que explicam o cenário vivido hoje na educação.
“Precisamos tratar da vulnerabilidade das famílias. De cada 100 crianças no país, só 27 fazem três refeições por dia. E a maioria delas está na rede pública. Ou seja, precisamos reconstruir políticas públicas também nesse aspecto”, disse o vereador.
Marcos também citou a necessidade de monitoramento de grupos que disseminam o ódio na internet, a urgência em identificar células neonazistas, a busca para que escolas tenham psicólogos e assistentes sociais, e um debate que precisa acontecer, relacionado à sobrecarga dos educadores.
O vereador falou ainda que prefere a expressão “cultura do bem viver” e frisou que qualquer avanço passa por investimentos no setor. “Não se faz educação pública, gratuita e de qualidade, e com inclusão, sem recursos”, explicou.
Posicionamentos
Educadores de peso da cidade de Anápolis estiveram na audiência pública. A coordenadora da Unidade Universitária de Anápolis da UEG (Bairro Jundiaí), Kesia Rodrigues dos Santos, lembrou que a escola é o reflexo da sociedade. “E temos construído uma sociedade de animosidade, de ataque, beligerante - e esse reflexo chegou à escola”.
Para Kesia, a discussão agora é definir como lidar com esse cenário, que deve passar pelo debate sobre que sociedade estamos construindo. “Recebemos na semana passada, na UEG, uma ameaça. Em 20 anos tivemos aulas de portão fechado. E isso é o que não queremos, que uma escola pareça um presídio. Fazemos parte da sociedade, queremos as portas da universidade aberta como sempre fomos”, ressaltou.
A diretora-geral do IFG Anápolis, Kátia Cilene Costa Fernandes, abordou a necessidade de atenção na formação dos professores. Ela também comunicou a criação do programa IFG pela Paz, que vai atuar no acolhimento da comunidade escolar e propor cursos de formação, além de fomentar encontros técnicos que podem servir de termômetro, tanto em relação ao que acontece dentro da instituição e na sociedade.
A presidente do Sindicato dos Professores da Rede Municipal de Ensino de Anápolis (Simpma), Márcia Abdala, falou sobre a necessidade de se criar mecanismos de prevenção nas escolas, que representariam a proteção não apenas dos estudantes, mas de cerca de 2,7 mil professores.
O presidente da Associação das Escolas Particulares de Anápolis (Assepa), Emerson Rodovalho Marques, lamentou que de um modo geral a sociedade não tem a sensação de segurança. “O cenário atual é mais um problema de segurança do que na escola em si”, comentou. Segundo ele, é preciso investimento na educação básica, cuja idade das crianças permite que se repassem valores que vão perdurar para a vida toda. Emerson falou ainda que é importante chamar os pais à responsabilidade.
A presidente do Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Privados de Ensino de Anápolis e Região (Sinpror), Jane de Oliveira, também falou sobre a necessidade do envolvimento das famílias no debate. “Estamos procurando um caminho para levar nossa sociedade a um patamar melhor, onde reine o respeito. Parece utópico, mas a participação de cada um, o respeito e a vontade que vão trazer o ambiente de paz, e a vontade de se superar, para cada pessoa, professor, aluno e família. Hoje existe angústia no coração de cada professor”, discursou.
A presidente da Pestalozzi Anápolis, Professora Geli Sanches, que no ato representou o deputado federal Rubens Otoni (PT), lamentou o fato de se estar discutindo violência nas escolas, ao invés de melhores condições de trabalho, incentivo à leitura e valorização dos profissionais.
“Quando era diretora e professora, nas reuniões de pais eu falava que os filhos eram nas escolas o reflexo de casa. Palavrões: eu falava na reunião o que as crianças diziam em sala de aula e os pais assustavam”, disse Geli. Nesse sentido, prosseguiu, a “escola reflete a violência pregada na sociedade”.
“Os últimos anos vivemos momentos de incentivo à violência. Formas de descontruir o que foi construído. Não devemos jogar a responsabilidade nas costas dos professores. Tenho falado da importância de se ter atendimento psicológico, investir na cultura de paz, atender alunos e profissionais da educação”, prosseguiu Professora Geli.
O secretário municipal de Educação, Alex Martins, falou da importância de a educação começar na família. “Temos de ter muita sensibilidade de entender esse momento. Não queremos que a escola seja considerada uma fortaleza. Não queremos portas giratórias nas escolas, primeiro porque não é funcional, não podemos revistar mochilas, mas a escola que era segura, não é mais”. Ele enumerou ações tomadas na rede municipal, que já possui vigilância desde 2022, e ressaltou que todos os professores e funcionários estão focados hoje em resolver o problema. “Mas qual o papel da família nesse contexto?”, argumentou.
A ex-secretária municipal de Educação Virgínia Melo, representante do curso de Pedagogia da UEG, fez uma explanação sobre o momento atual. “Esse é um assunto sensível, muito sensível. Não é novo, mas nas últimas semanas ganhou tom forte, pois pega nossa emoção quando a gente vê o que acontece. É doloroso ver criança ou professor sendo morto, agredido, e pensar na possibilidade de que isso aconteça com alguém nosso. Isso nos fere imensamente. Temos de pensar que isso não é uma coisa nova, mas qual nosso papel e responsabilidade?”, iniciou a educadora.
Segundo ela, o importante é saber de onde vem a situação atual e como vai acabar. “Não podemos e não queremos uma escola apartada da sociedade”. Para ela, estamos vendo o resultado de algo que começou há muito tempo. “Um desmonte, a desvalorização da escola e do professor. Há muitos anos se fala da educação, mas olha o estado que ela está”.
“O pai não educa o filho, mas quando ele não dá conta coloca na escola militar.
Qual professor quero formar? Que aluno quero formar? Há muito tempo que a formação de professores tem sido dificultada. Desde 2019 está sendo imposto que professores formem alunos empreendedores. Quero isso ou alunos que tenham valores humanos de respeito ao próximo?”, argumentou Virgínia.
A professora também falou da militarização das escolas. “Com todo respeito aos militares, mas isso representa a desvalorização absoluta dos professores. Quando entrego para o militar, deixo claro que acredito que o professor não sabe gerir”, explicou.
Também participaram do debate a vice-presidente do Conselho Municipal de Educação, Rosangela Queiroz; o 1º tenente Rocha, representando o comando do 3º CRPM; além de diversos professores, diretores de escolas públicas e privadas. O vereador Reamilton Espíndola (Republicanos) também participou da audiência pública.